quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Férias e coisas assim….



Ainda era Agosto e o mês levava uma semana e uns dias mais para terminar. Chegamos à ilha num sábado, num belo dia de sol.
Quando para ali vou, gosto de cortar com o resto, com o que deixei, com o que ficou para trás. As férias são para mim um virar de página, quero estar noutro registo, rompo com as rotinas que tinha em trabalho e no meu quotidiano. Crio outras rotinas, que serão as daqueles dias que em nada são semelhantes ao período de trabalho. É o meu tempo de lazer, do dolce fare niente, da troca de horários, da mudança da indumentária e do calçado, dos cabelos ao vento, despenteados, do gloss nos lábios e nada mais…
Nesse sábado, à noite, fomos jantar a casa de uma das minhas sobrinhas. Tudo seria perfeito, não fosse o peixe ter pouco sal. Não me lembraria de vir a comer em Porto Santo, salmonetes grelhados e não só, também apareceram pargos, bodiões e charuteiro. Acompanhava uma fabulosa salada de tomate do Porto Santo (aquele cultivado nos terrenos arenosos), salpicada de orégãos secos, outra de vários tipos de alfaces e rúcula e umas batatas cozidas com casca e salpicadas em azeite. Regamos com sangria de frutos vermelhos e vinho branco e terminamos com uns suculentos quadrados de melancia.
Antes do repasto e como é apanágio da minha sobrinha, começou a chegar à mesa entradinhas deliciosas, beberas pretas, queijo da Ilha de São Jorge, patê e salsichas de ervas frescas grelhadas.
A noite prolongava-se quente, aconchegante, os comensais muito heterogéneos, uns conhecidos naquele momento, mas nem por isso inibiu o desenrolar das conversas à volta das mesas. Outros, amigos comuns, com mais ou menos proximidade, proporcionaram um ambiente descontraído, leve e despretensioso.
Nos dias que se seguiram o ritmo foi sempre calmo, de manhã fiz caminhadas, à tarde praia, à noite passeios pela vila, idas ao café e “assaltos” às lambecas. Levei dois livros que fui lendo intervaladamente.
Lá em casa, as tarefas distribuíram-se sem qualquer imposição, creio eu, cada uma de nós assumiu aquilo em que está mais confortável, eu andava pelos tachos e panelas, a minha irmã nas limpezas, de vassoura na mão, expurgava todo o grão de areia que via pela frente.
Ela era a primeira a acordar, fazia um café bem forte. Quando me levantava já havia pão fresco e fruta comprada no dia. A meio da semana chegou uma outra irmã (a matriarca da família), que automaticamente ocupou o meu lugar na cozinha. Fiquei mais liberta para os meus devaneios de pensamento livre, leituras, músicas e passeatas.
A casa ficou mais cheia, o único homem ali existente, foi sendo excessivamente mimado, ora nas ementas preferidas, ora nos cafés a frequentar, nas horas de ir à praia ou até na escolha da mesma para passar o fim de tarde.
Com algum esforço ainda fiz um churrasco em casa para amigos e família, contei com a gentileza de um amigo do marido da minha sobrinha, porque efectivamente o António ficou sempre na retaguarda, mesmo sendo no dia de folga/descanso. Se existem coisas que tenho cada vez mais certeza é de que o meu marido nunca vai liderar uma cozinha e organizar um churrasco. Tenho tido uma luta inglória, já lá vão 23 anos de muita persistência.
Foi um sucesso e começou a sair muito bem a sangria de frutos vermelhos. A entremeada, as febras e as costeletas foram chegando à mesa, acompanhavam as batatas cozidas com casca, uma salada verde e outra de tomates do Porto Santo com lascas de cebola e orégãos.
À noite observávamos a lua, talvez para sentir mais energia e sintonizar forças positivas. Numa dessas observações, discutimos a fase que decorria, eu sabia que em forma de D a lua estava a crescer (quarto-crescente) e que em forma de C a lua estava a diminuir (quarto minguante). A lua crescia para Lua Cheia, mas o meu marido e a minha irmã entendiam ao contrário, ainda ripostei vivamente, depois deixei-me ficar e passados dois dias não havia como negar os factos, o céu apresentava uma Lua Cheia, bem iluminada, o brilho e o luar da noite, acabaram por silenciar as vozes discordantes.
Houve uma noite em que ficamos à conversa, as três irmãs foram recordando vivências da infância, pormenores que uma delas se lembrava num espaço mais próximo, entretidas gargalhamos, rimos e esboçamos sorrisos até bem tarde.
Ainda numa outra noite e numa deslocação rotineira à vila assistimos a um Festival Internacional de Folclore, apanhamos um grupo da Galiza, com gaita-de-fole, instrumento popular, que eu julgava ser mais típico dos irlandeses e escoceses, mas que no fundo também tem origens em Espanha (grupo ibérico, franco, bretão). Foi um espectáculo animado, com miúdas jovens e muito bonitas, os trajes eram riquíssimos. Deixou-me bastante surpreendida. Afinal ainda existem coisas que nos surpreendem, mesmo sendo numa “terra do nada”….
16-09-15

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Era um Fiat 600 Branco,



Era um Fiat 600 Branco,
Estas noites grandes e quentes de Verão são excelentes para recordar o que já lá vai. Neste fim de semana e em casa de uns amigos falávamos das nossas saídas, dos bares e das discotecas que existiam.
Vim a lembrar-me das minhas “aventuras” com uma amiga que conduzia um Fiat 600 Branco. Pequeno, ligeirinho, arrumava-se em qualquer espaço. A coisa depois evoluiu para um Renault, um Fiesta, um Nissan Micra e por aí adiante ….
As miúdas à sexta-feira iam jantar em grupo ou sós, conforme calhava, mas o certo era passarmos invariavelmente pelo Salsa Latina.
Mal o bólide apontava na Imperatriz Dona Amélia, os nossos olhos não paravam para ver as matrículas e os carros já estacionados. “Já está”, “ainda não chegou”, “deve ter vindo de boleia”…. confesso que muitas das vezes ela perguntava-me “viste já o carro estacionado”, e eu, não fosse a rapariga inverter a marcha rumo à rua do Til, dizia convictamente “ está ali, já vi” , estaciona tu à frente, tens um lugar.
Mesmo antes de chegarmos ao Salsa, já ouvíamos a música, os Salsinhas tocavam pela noite dentro, as nossas músicas, os nossos hits, aquela que nos prendia o olhar e cortava a respiração, aquela que nos fazia borbulhinhas na barriga, que nos corava, que nos deixava os braços em pele de galinha.
Um dos músicos tinha uma relação de amizade de longa data com a minha amiga, amigos de liceu e de matinés dançantes em garagens, e a música quase que se tornava em “música pedida”, ele tocava “You are so beautiful” do Joe Cocker e lá íamos nós para junto do balcão de copo de Whisky na mão (copo fino e alto com muitas pedras de gelo), e cantarolávamos pela noite dentro.
Não precisávamos de mesa, sempre preferimos ficar de pé junto à banda ou na esplanada, encostadinhas a um parapeito de uma janela. Eu gostava muito de ouvi-los cantar Rolling In The Deep, Creedence C R (Have you ever seen the rain), Cat Stevens (Father and Son), James Taylor (you’ve got a friend), Eric Clapton, Elton Jonh e não me esqueço nunca como ele cantava e/ou imitava na perfeição a voz do Paulo de Carvalho.
Ficávamos para ali até às 2 da madrugada (hora em que o bar encerrava), não seguíamos para a discoteca, porque já nessa altura não eramos muito adeptas dos ambientes fechados.
Mas ninguém se esquece das velhinhas Vespas em cima da Ponte do Ribeiro Seco, do Barbarela e do Bar On The Rocks no final da Carvalho Araújo.
O Fiat 600 também ia para os jantares do grupo ou por vezes ficava estacionado no Largo do Colégio, que era o nosso ponto de encontro, escolhíamos restaurantes onde pudéssemos estar à vontade e fazer barulho, no Restaurante do Poiso, na Camacha, era a Televisão, o Regedor e o Café Relógio, no Caniçal íamos para o Bar Amarelo, no Porto Novo, era a Feijoada por debaixo da ponte e em Camara de Lobos, o restaurante da praia.
Quando íamos só as duas ou com mais amigas, optávamos por uma Pizzaria que existia na Avenida do Infante, que também tinha esplanada, chamava-se A Rampa e escolhíamos uma pizza de nome “Diana”, ou o Mama Mia no Restaurante Fora de Horas, no próprio Salsa Latina (que servia umas lulas divinais) ou um de grelhados na chapa que existia no terraço do Centromar e do qual não me recordo o nome.
Este Fiat ainda foi do tempo em que os portugueses recém - encartados ostentavam na traseira um dístico indicador, circular de cor amarela e com a inscrição do número “90”. Isto indicava ao condutor traseiro que conduzia um outro condutor com menos experiência. Para mim ficava mais confiante, o aviso já estava feito, convinha os carros não se colarem muito atrás e deixarem um espaço de segurança.
Eu ainda não tinha carta de condução mas sabia muito bem ditar as regras e as prioridades, para evitar os vermelhos e quando o sinal estava verde, era caminho a direito, mesmo que fosse uma subida, dizia ”prego ao fundo”, quando tínhamos forçosamente de parar porque o sinal estava vermelho e mudava para o verde, dizia, “para” “puxa o travão de mão e arranca”, e depois era aquela coisa “passa, vem mais a direito, para a frente, roda só a traseira, não dá, vai bater, pronto já está, para ….”
Aquele Fiat ainda nos levou a rallies, para o Poiso, Terreiro da Luta, Monte, e durante uma serie de anos transportou-me todos dias, na hora do almoço, quando vinha a casa da minha mãe.
À condutora do Fiat devo a minha pontualidade de hoje, nunca respeitei os horários, era sempre uma pessoa super atrasada, até um dia que me meteram na linha…
Devo à condutora do Fiat muitos anos de uma boa conversa, de um bom ombro amigo, de boas gargalhadas, de alegrias, mas também de algumas tristezas, angustias e de lágrimas nos piores momentos.
Ficam e morrem connosco histórias, confidências, partilhas de momentos mais angustiantes, onde a vida parecia que tinha andado para trás, ilusões e sonhos sem data marcada, encontros onde tudo tinha uma dimensão maior do que devia de ser, porque tudo era vivido com uma intensidade acrescida. Ah! Ingénuas que fomos….

19.08.15


sexta-feira, 31 de julho de 2015

Ferias de Verão



Férias de Verão,
Gosto do Verão, do calor, do céu azul e o sol a brilhar. Gosto dos dias quentes, grandes, de não ter de olhar para o relógio e contabilizar o tempo, de mudar por completo a rotina, das roupas leves, de cores claras e de não esticar o cabelo.
Recordo o Verão da minha meninice, em Santas Cruz na casa das tias, na Madalena do Mar na casa do Passo, em Porto Santo e em casa dos meus pais no Funchal.
Lembro-me daqueles dias intermináveis, onde andava pela casa de quarto em quarto, a vestir roupas das minhas irmãs e a olhar-me ao espelho, a ler, a ler muito, a ouvir musica, a musica também dos meus irmãos, a andar de bicicleta no quintal, a brincar com a minha amiga de infância (vizinha de porta), a brincar com os amigos do meu irmão (só rapazes), a fazer as “voltinhas“ que a minha mãe pedia (ir à mercearia acima de casa, à barraca e à casa da costureira) e de ir a pé à biblioteca da Gulbenkian requisitar mais um livro.
Gosto das férias que tenho vindo a fazer de há uns anos para cá, em Porto Santo, sem rotinas. Gosto de acordar apenas quando o corpo pedir, fazer a caminhada na praia, comprar o pão, regressar a casa e pequeno almoçar, sem pressas, sem pressões, sem computadores e sem gadgets. Voltar à praia pelas 16h/17h e por lá ficar a banhos até o dia findar e o sol desaparecer por completo. Adoro sentir os últimos raios de sol (mornos) penetrar na pele, e acariciar a areia fina entre as mãos, deixá-la escorrer pelos dedos e o resto o vento levar…
Gosto do vento, da pequena brisa do final de tarde, de estar de livro aberto ou de simplesmente ficar de olhos fechados, sonhando que o mundo termina ali, naquele silêncio infinito, apenas o barulho das ondas a romper na areia já fria e molhada.
Gosto de jantar tarde, coisas simples, frescas, saladas e pratos leves acompanhadas de um bom copo de vinho branco bem fresco. Ir à vila, fazer a rota do costume, comer uma “lambeca”, sentada no muro, vendo a gente passar, descontraidamente de chinela no dedo, calções, vestidos leves, roupa de praia, cabelos soltos e secos ao natural, tudo no seu modo mais informal, porque estamos em férias e férias são descanso, são o romper com tudo aquilo que vinha sendo hábito.
Gosto do passeio nocturno ao cais e de ficar lá bem na ponta e de olhar a ilha como se em alto mar estivesse. Gosto de olhar aquela gente de pele bastante tisnada, de olhos claros, dentes amarelados e de ouvir o falar cantado e melódico dos Porto-Santenses.
Gosto de comprar os tomates pequenos e bem maduros, os figos, as uvas e a melancia. Até gosto daquela pasmaceira, daquele marasmo que nos contagia e nos deixa sem vontade de nada fazer, de ficar para ali jogada, observando os veraneantes, encontrando amigos de longa data, aqueles que não víamos há muito, que vivem em Lisboa, outros fora de Portugal, cumprimentando, fazendo “conversa de verão”, (por aqui novamente, os pequenos estão crescidos, um já na Faculdade, outro a caminho, os pais velhinhos mas ainda vivos, as memórias, as lembranças, ai tudo como era…)
Até gosto de ir todos os dias ao supermercado e vir a pé com os sacos pelas mãos, há sempre qualquer coisa que falta lá em casa para além do pão fresco.
Gosto de entrar na Igreja da vila, quando ela está vazia, quando não tem muita gente e ficar um pouco lá sentada, e pensar e meditar ou simplesmente ficar a olhar e a sentir o silêncio e escutar o barulho na rua das crianças, dos adolescentes excitados com as primeiras saídas sem os pais por perto.
Ali tudo acontece, tudo acontece às vezes pela primeira vez, inesperadamente.
E…inesperadamente tudo ali fica, enterrado na areia, num verão que passou, porque foi de uma estação que findou, porque o calor apertava, o mar era quente, as noites cálidas e a lua bem alta vigiava os nossos sonhos e as nossas fantasias.

31-07-15




sexta-feira, 24 de julho de 2015

Carros, Rali VM e tolerância de ponto,



A propósito do grande evento que aí vem, o Rali Vinho Madeira de 2015, esta semana andou uma série de gente num frenesim a querer saber se haveria tolerância de ponto na sexta-feira dia 31 de Julho.
Desde já digo, escusam de comentar e de criticar a minha posição, e peço desculpa a quem muito aficionado é a estas coisas de bólides e corridas, mas considero insensato atribuir uma tolerância de ponto para que toda a função pública acompanhe o rali.
Já produzimos pouco, já trabalhamos sem objetivos, sem critérios rigorosamente definidos, sem motivação e sem entusiasmo. Estamos na Europa (lá bem no fim do fim….) mas não usufruímos salários mínimos equivalentes a outros países daquele grupo. O ser humano reage a emoções, não havendo troca, compensação justa e equitativa, porquê se esforçar, porquê trabalhar com brio profissional e bem. Qual a mais-valia, qual o proveito, qual o retorno de um trabalhador exemplar?
São poucas as pessoas que por uma questão de atitude, de consciência e de postura, põem em tudo o que fazem o seu melhor, esmeram-se, fazem um bom trabalho porque assim tem de ser feito. Está em causa a própria pessoa, a sua integridade, e o seu bom desempenho.
Seja como for, para mim não é consensual, uma ausência ao trabalho, por motivos de uma prova automobilística.
Mas as pessoas opinam segundo as suas convicções e as coisas que lhes dão satisfação e contentamento e de facto já escrevi antes e volto a repetir não sou fã de bólides.
Não gosto de conduzir, nem de estacionar carros, nem tão pouco de fazer inversão de marcha. Apenas conduzo por necessidade e por uma questão muito importante na minha vida, a minha independência.
Nunca teria um carro descapotável, porque nunca saberia se olhariam para o carro ou para a pessoa que o conduz.
Também nunca teria um carro vermelho, nem necessito equacionar os motivos.
Gostaria de às vezes ter um bom Jeep, que jeito me daria?! Cruzo a Avenida do Mar quatro vezes por dia e assisto a cada cena, uma mais deplorável que a outra.
As cabeças vão ziguezagueando, lado esquerdo, lado direito, abre vidro, fecha vidro, endireita o espelho, faz pisca e não muda de marcha, pára no semáforo amarelo, quando estamos cheias de pressa, etc, etc…
Agora que estamos no Verão anda tudo mais lento, a cidade enche-se de continentais, espanhóis e emigrantes, que ao invés de conduzirem, passeiam a família, mostram orgulhosamente o quanto evoluiu a terra que os viu nascer.
A Avenida vai cheia de miúdas giras, mais despidas e mais atraentes, como o calor assim obriga. Na nova Praça do Mar estendem-se os putos a praticar skate, improvisam plataformas e executam manobras de baixos e altos graus de dificuldade. Exibições fantásticas, cujos cenários por vezes embaraçam o trânsito.
Mesmo não gostando de carros e porque há coisas e há pessoas a quem não podemos dizer que não, aqui há muitos anos quando os meus miúdos eram pequenos participei através do Infantário que eles frequentavam num rally paper.
Ia morrendo de enjoo, decoramos o carro todo, o tema era os planetas, e o carro tinha a Lua, o Sol, Marte, Júpiter e Plutão. Desempenhava o papel de co-piloto e tinha a incumbência de além de transmitir as mensagens padrão, completar as respostas, seguindo as pistas, olhando para os papéis, escrevinhando, entrando e saindo do carro à procura de coisas e de objetos. Cheguei heroicamente ao fim e bem colocada porque não gosto de perder, nem a feijões.
Espero muito sinceramente que os madeirenses aproveitem o primeiro fim de semana de Agosto, desfrutando do rali, e já agora só para que fiquem a saber o meu carro é um simples Renault Clio, cinza prata.
24-07-15